PARA TERCEIRA TURMA, DOAÇÃO DE IMÓVEL SUPERIOR A 30 SALÁRIOS MÍNIMOS EXIGE ESCRITURA PÚBLICA:
A doação de imóvel
de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo do país deve ser feita por
escritura pública. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal
de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul
(TJMS) segundo o qual a doação, nessas condições, poderia ser formalizada
também por contrato particular.
Os ministros deram
parcial provimento ao recurso em que uma empresa buscava afastar a exigência de
construção de uma arena cultural em imóvel que lhe foi doado – encargo que
constava inicialmente do contrato particular de doação.
Na escritura pública
lavrada para aperfeiçoar o negócio, a doação foi descrita como pura e simples –
ou seja, livre de condições ou encargos. Na sequência, as partes estabeleceram
um aditivo contratual particular, por meio do qual foi retificado o instrumento
original para que a doação constasse como pura e simples, afastando-se o
encargo. No entanto, a empresa doadora pediu em juízo a revogação da doação,
alegando que a donatária não cumpriu a obrigação de construir a arena cultural.
Dúvidas sobre a declaração de vontade da
doadora
Em primeiro grau, o
pedido foi julgado improcedente, sob o fundamento de que o instrumento
particular não poderia prevalecer sobre a escritura pública.
O TJMS reformou a
sentença e revogou a doação, entendendo que a transferência do imóvel poderia
ter sido formalizada por contrato particular, conforme o artigo 541 do Código Civil –
que permite às partes escolherem a forma a ser utilizada no ato. Para a corte
local, esse dispositivo, por ser norma especial, prevaleceria sobre a regra
geral do artigo 108 do CC,
o qual exige escritura pública para negócios que tenham como objeto imóveis de
valor acima de 30 salários mínimos.
Além disso, o TJMS
considerou haver dúvida sobre a declaração de vontade da doadora, de maneira
que a interpretação deveria ser favorável a ela, a fim de prestigiar a boa-fé e
a função social do contrato, principalmente em vista do alto valor atribuído ao
imóvel (R$ 2 milhões).
Ausência de conflito de normas
Segundo o ministro
Marco Aurélio Bellizze, relator do recurso, a possibilidade de o doador e o
donatário escolherem como formalizar a doação deve ser interpretada de acordo
com as diretrizes da parte geral do Código Civil, as quais preveem que a
declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei o
exigir (artigo 107), e
que o negócio poderá ser celebrado mediante instrumento público por interesse
das partes, no silêncio da lei (artigo 109).
Dessa maneira, para
o magistrado, em uma interpretação sistemática dos artigos 107, 108, 109 e 541
do Código Civil, doações como a discutida no recurso (de imóveis de mais de 30
salários mínimos) devem ser efetivadas mediante escritura pública.
Segundo o relator,
diferentemente do que entendeu o TJMS, não há como aplicar o princípio da
especialidade, pois este pressupõe um aparente conflito de normas – o qual não
existe no caso, pois ambas as regras coexistem harmonicamente, impondo-se
apenas uma adequada interpretação sobre elas.
Efetiva vontade das partes e princípio da
boa-fé objetiva
O magistrado
observou que, no caso dos autos, a real intenção das partes era a celebração de
uma doação sem ônus à donatária, pois "assim constou da escritura pública
e foi confirmado, posteriormente, pelo aditivo ao instrumento particular".
Em interpretação
restritiva das cláusulas contratuais (artigo 114 do CC),
Bellizze concluiu que a doação foi pura e simples, o que justifica o
restabelecimento da sentença que julgou improcedente o pedido de revogação por
inexecução de encargo – "sobretudo diante do teor do instrumento público
(forma indispensável para a concretização do contrato), que não apenas é
silente a respeito da imposição de encargo como prevê explicitamente o caráter
puro e simples da doação".
Leia o acórdão no REsp 1.938.997.
Fonte: STJ.
RODRIGO ROSA ADVOCACIA
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